Muito mais que música…

Muito mais que música…

Já passei pela insanidade dos Guns, já vivi o Grunge duma forma cega e obcecada e até já tive paragens cerebrais onde ouvi coisas que nem me atrevo a citar, sob pena de ter que me auto-flagelar novamente.

Mas foi há cerca de 18 anos que me apareceu nas mãos um disco que comprei sem hesitar, mesmo não sabendo o que ia encontrar… “The Single Collection” de David Bowie. Como parece óbvio, não foi aos 17 anos que conheci o Mestre, mas foi aos 17 anos que decidi ouvir não apenas “Ziggy Stardust“, “Rebel Rebel“, “Heroes” ou “China Girl“.

Suffragette Citty“, “John, I’m only dancing“, “Fame“, “Beauty and the Beast“, “Fashion“, entre outras, pareceram-me diferentes do que estava habituado. Os sons de Seattle tinham-me moldado o nervo auditivo, mas ficou a vontade de “aprender”. Quando é o mestre a ensinar, os níveis de eficácia aumentam, principalmente quando estamos predispostos a receber todos os conteúdos, neste caso, todas as notas e melodias.

A pesquisa pela sua discografia não podia ficar só pelos “Best’s” e, como é mais lógico, começa-se pelo início.

Descobri, então, um Bowie que poucos se interessam em conhecer e que passa por algo que nasceu em 1967 dum jovem de 20 anos que edita um disco, sem estilo definido, marcando uma irreverência audaz para o seu tempo, esquecendo as melodias que a mainstream da época exigia. Podia ter sido um final trágico? Não creio. Acredito no talento natural e isso não está ao alcance de qualquer um. Desta forma, Tony Visconti viu em Bowie alguém que poderia mudar o mundo da música, sonora e visualmente.

Durante a década de 70, Bowie encarnou em personagens androgenas, extravagantes, irreverentes, visualmente provocadoras, onde se destacam Hunky Dory, Ziggy Stardust, Aladdin Sane e Thin White Duke que preencheram uma década de melodias que definiram estilos e continuarão a servir de influencia para gerações vindouras. Estamos a falar duma década onde Bowie mostrou que o seu processo criativo esteve demasiado quente para o que o mundo de então estava preparado, editando onze discos de originais.

Esta foi a década de Bowie. Se nos anos 60 os Beatles ditaram as regras e as tendências, a década de 70 é um exclusivo David Bowie.

Ficarão para sempre registos inesquecíveis para os amantes da música. Com The Man Who Sold The World editado em 1970, Hunky Dory em 1971, The Rise and Fall of Ziggy Stardust and the Spiders from Mars em 1972, Aladin Sane em 1973, Diamond Dogs em 1974 e Young Americans em 1975, deixaram os fãs e a crítica completamente estarrecida. Podia enumerar os hinos escritos e compostos por Bowie, mas ia tornar a conversa maçadora… Todos já conhecemos o que estes seis anos forneceram em termos de criatividade e originalidade. São seis anos marcados por personagens visualmente diferenciadas mas o rumo melodioso era o do sucesso. Nestes seis anos, Bowie deixa de ser um jovem promissor para ser um grande músico, compositor e letrista.

Se a satisfação pessoal pelo que tinha aprendido em apenas nove anos da história discográfica de David Bowie na fértil década de 70, sou confrontado pela trilogia de Berlim, onde editou Low e Heroes em 1977 e Lodger em 1979. Nesta altura nada me surpreendia, e começar esta nova etapa com “Speed of Life“, “What in your World“, “Sound & Vision ou Be My Wife” dão-me garantias que o Mestre não descansa. Ainda não estava recomposto e “Beauty and the Beast“, “Heroes“, “Sons of the Silent Age” ou “Blackout” permitiriam que Bowie terminasse a década em descanso, que seria justo. Mas o fim da trilogia de Berlim dá-nos de mão beijada “Boys Keep Swimming“, “Look Back in Anger“, “DJ“, “Move On”! Nestes três discos Bowie consegue dar ao mundo hinos que jamais esqueceremos mas também usar muito do seu experimentalismo, onde ousou editar temas que muitos músicos não teria coragem, quer pela sua complexidade, quer pela sua audácia.

Nesta altura estão os mais atentos a pensar… faltou algo por aí… sim… Station to Station, o longa duração mais curto da “década maravilha” intencionalmente deixado para o fim. Este disco pré Berlim, que dá origem a Thin White Duke, para muitos o último grande alter-ego de Bowie, fazem-no abraçar a Soul com uma classe inimaginável. Station to Station é um disco com apenas seis temas, mas sentimos que qualquer um deles merece marcar presença em qualquer Best Of de Bowie.

Após estes anos de ouro, Bowie continuou a definir tendências, a editar discos que perdurarão, como Scary Monsters, Let’s Dance ou Black Tie White Noise, onde temas como Ashes to Ashes, China Girl, Let’s Dance, Cat People, Day In Day Out ou Jump They Say encheram os tops de vendas e auditórios radiofónicos.

The Next Day marca o regresso de David Bowie após dez anos de um longo jejum. Já eram poucos os que esperavam por um novo disco de originais. Vivemos dez anos de reedições. The Next Day encheu-nos o coração.

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