Reportagem A Naifa @ Teatro do Campo Alegre . Porto

Reportagem A Naifa @ Teatro do Campo Alegre . Porto

Há uns anos li um estudo feito por uma equipa de neurologistas no qual defendiam a tese que eram necessários, a qualquer humano, dez anos de aprendizagem e treino disciplinado para ser bom a alguma coisa. Bom a nível mundial. Bom o suficiente, tendo como exemplo o piano, para dar um concerto competente.

Nestes dez anos que passaram desde a gravação do primeiro disco, a música d’A Naifa está excelente.

No concerto do Porto, no regresso ao auditório do Campo Alegre, A Naifa mostrou como ainda há melhoria a ser fabricada, como a acústica das palavras dos nossos poetas tem uma nuance secreta que ainda não tinha sido ouvida nem no disco nem nos concertos anteriores. Mesmo reincidindo na presença parece que os concertos d’A Naifa não se repetem e, para piorar esta enfermidade de os querer tanto, não param de melhorar.

Duvido que em 2004 Luis Varatojo tocasse assim de forma tão esclarecida a guitarra portuguesa ou que a Mitó já tivesse tão à flor da pele a poesia de sempre. Em 2012, no primeiro concerto que presenciei com Sandra Baptista no baixo e Samuel Palitos na bateria, o sabor das canções subterrâneas, ali a 3 minutos antes de a maré encher, ainda eram uma aproximação envergonhada à inocente inclinação para o mal que a doce malícia destes corações desobedientes tem por lei.

Ir a um concerto d’A Naifa é uma experiência familiar, é uma visita dos parentes de Lisboa que trazem a sofisticação da metrópole no corpo e a doçura proletária da raiz tradicional nas palavras. A sala fica assim repleta de primos enérgicos e barulhentos, levemente amuados por faltar sempre uma canção mas unidos pelo amor precioso de sabermos que em breve, demasiado breve, vamos todos para casa a ser assim, nas palavras de José Luis Peixoto, “uma avalanche de vidro, o segredo de um gigante” após ouvir as palavras dos poetas. A Naifa é, ainda além de tudo o que já disse, uma escultura em constante movimento que homenageia os nossos poetas de agora em tudo o que é cantado e na maravilhosa projecção no fundo do palco com os nomes de todos os que emprestaram as palavras e as imagens durante estes dez anos de partilhas.

No final dessa projecção, A Naifa surge gigante na tela a declarar “10 anos a rasgar”; tomo de empréstimo as palavras finais do poema “Deslocalização da Primavera” de Margarida Vale de Gato na esperança que as andorinhas jamais deixem de fazer em nós o ninho costumeiro mesmo que noutros poisos porque “…o tempo assim é amor que não azeda mas demora na reserva.”

Texto: Nuno Monteiro

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