Silva no Sá da Bandeira + Entrevista

Silva no Sá da Bandeira + Entrevista

Depois de em 2017 actuar no Super Bock Super Rock e em 2018 no Vodafone Paredes de Coura, SILVA completa o seu hat-trick em Portugal com 9 datas esgotadas no Porto e em Lisboa. 

O músico brasileiro de 30 anos, consegue desafiar as leis da MPB e veio-nos mostrar o seu mais recente álbum, “Brasileiro”, editado no verão do ano passado. Um espectáculo que é inspirado por ritmos do Mundo, pela música popular brasileira e com um toque de indie-pop que só Lúcio Silva consegue dar aos seus temas. 

O concerto contou com os mais recentes temas do artista, que por opção dos últimos tempos, dá preferência a shows mais íntimos, daí não nos presentear com músicas bem mais mexidas e batucadas dos seus álbuns de estreia. O suspense da espera é finito às 21h45, quando SILVA enche o palco com um só violão para interpretar o tema “Carinhoso”, de Orlando Silva – um dos temas mais importantes da cultura da MPB. Entre momentos mais resguardados e outros com mais luz e abertura, o músico vai aproveitando para falar com o público, que mostra vontade em falar com o artist, de um jeito muito informal.

Quando achávamos que conhecíamos bem o álbum “Brasileiro”, SILVA partilha connosco algumas curiosidades da produção do mesmo, como por exemplo, que o tema “Prova dos Nove” foi escrito pelo namorado da sua sogra, há 25 anos no Recife. Ou que a música “Duas da Tarde” surgiu depois de uma conversa com o compositor e cantor Marcus Valle, quando Lúcio lhe pergunta qual é o segredo para estar tão bem conservado. A resposta foi “acordar todos os dias às 2 da tarde e nunca se sentir culpado por isso!” – a piada gera risos na plateia, que rapidamente troca as gargalhadas por uma onda melancólica que assoberba o Teatro Sá da Bandeira. 

SILVA fecha a primeira parte do concerto com os temas “Infinito Particular” e “Júpiter”, mas depressa volta para os braços dos portugueses incansáveis, que desde logo começaram a pedir só mais uma música. Lúcio volta e presenteia-nos com a tão conhecida “Fica tudo bem” (desta vez sem a Anitta!) e termina com um pedido, para naquela última música se colocarem todos em pé. Os corpos do público, até então serenados pela complexa simplicidade dos seus temas, rapidamente acordam com os ritmos de “A cor é rosa”. Todos balançaram, dançaram, sorriram, e aplaudiram.  

Os assobios e aplausos foram muitos e as saudades, deste lado, já se instalaram. 

Silva @ Sá da Bandeira

Tivemos o privilégio de falar um pouco com o artista, e cá fica o resultado!

Saímos sempre dos teus concertos com o coração mais quentinho. Conseguiste esgotar a Casa da Música, o Capitólio em Lisboa, e esta data foi surpresa… Como é ser tão bem recebido no Portugal? Pois é, foi muito bonito. Sinto-me muito lisonjeado em ser tão bem recebido aqui. Eu já tenho vindo a falar que as pessoas conhecem o meu trabalho aqui em Portugal desde 2012. Eu ainda me lembro da primeira vez que vi num site de música falando sobre o meu trabalho e eu comemorei “Olha, mãe, cheguei em Portugal!” [risos]. E hoje chegar aqui e ter os lugares cheios e as pessoas vendo a minha música, isso me deixa muito feliz. É uma sensação de missão cumprida. Eu aqui sinto-me em casa! É uma cidade em que eu moraria. Eu sei que está um pouco na moda, essa coisa dos Brasileiros virem para cá [risos], mas é um lugar onde eu me sinto mesmo bem. Pode ser que eu venha, daqui a um tempo! [risos]

Em 8 anos de carreira já nos deste 5 álbuns e 1 EP. O SILVA do álbum “Brasileiro” é o mesmo do SILVA do álbum “Gratidão”? Não mesmo, eu mudei muito! Acho que foi um processo pessoal, sabes. Os meus discos acompanham muito os meus momentos, quase nunca tenho personagens, é sempre tudo muito auto-biográfico. Eu mudo muito na vida, mesmo! Eu sou um cara que sou calmo mas ao mesmo tempo de vez em quando preciso de mudar tudo para me sentir animado, interessado, empolgado de novo. Então esse elemento surpresa é muito importante para mim.

Ainda nos lembramos do teu concerto no Auditório de Espinho, em 2013. Costumas preferir plateias calmas ou o público dos festivais? Sendo que já tocaste no SBSR e em Paredes de Coura.Eu tou virando na amarra! [risos] Um camaleão, quase! Este ano para mim… eu fiz shows de Carnaval, no Brasil, que foi um desafio completamente diferente! Havia pessoas em pé, a beber naquela festa toda. Foi um show com 3 horas de duração, muito cansativo mas ao mesmo tempo muito empolgante. Mas eu também adoro um show de teatro, onde você consegue explorar as nuances. Se eu quiser tocar uma música bem calminha e silêncio total, às vezes você consegue brincar com o silêncio. É uma dinâmica completamente diferente e eu fico feliz de poder fazer as 2 coisas. Quando eu cansar da calmaria do teatro, eu vou para um show maior, de festival. 
É difícil ligar e desligar essa “chavinha” na cabeça, mas eu estou a aprender a fazer e estou gostando. 

Agora que falas em Carnaval… para 2020 podemos contar com o Bloco do Silva? Sim, sim, sim! Na verdade isto foi uma experiência! Nós não tínhamos a pretensão de virar disto uma coisa grande como virou, e agora as pessoas no Brasil estão a pedir que isso vire disco, que vire um álbum de Carnaval. E eu falo “Calma, espere aí que é a primeira experiência!” [risos]. Mas sim, eu quero fazer no ano que vem e até quando eu tiver saúde para fazer! Porque é preciso mesmo muita saúde. [risos]

Neste álbum deste-nos um dueto improvável, com a Anitta. Para o próximo álbum tens alguma surpresa que possas partilhar connosco?Eu ainda não sei do próximo álbum porque desta vez eu não vou emendar logo. Eu venho emendando um álbum no outro desde que comecei. Desde que eu lancei o meu EP já vão 7 anos de carreira. Eu já lancei 5 discos, é quase um por ano. Então eu agora quero fazer o próximo álbum com mais calma, talvez para 2020… vou deixar este ano rolar sem essa pressão. Mas, quero fazer singles, com pessoas de suporte [risos]. Ainda são surpresa mas eu já estou programando, já entrei em contacto, já fui conversando, daqui a pouco eu solto [risos].

Tens uma formação clássica desde muito cedo. Porém, nos teus álbuns e espectáculos há sempre uma versão mais alternativa e electrónica das músicas. Há algum artista que te inspire nesse processo? Pois é! Eu quando comecei, eu tinha uma inspiração muito internacional. Eu ouvia muitas coisas de Inglaterra, Califórnia, Japão. Acabava por ouvir muita coisa de tudo o quanto é canto. De uns tempos para cá eu comecei a conectar-me mais com as minhas raízes, com a música brasileira – que é vasta. Tem imensa coisa para se conhecer. Continua a haver muita coisa que eu tenho descobrindo, que eu nunca ouvi falar, quase que fico revoltado comigo mesmo! “Como é que eu não conheci isto antes, é tão bonito!”. Então estou nessa fase de pesquisar coisas sobre o Brasil, que não estão ali na primeira prateleira, não são as coisas mais óbvias. Então acho que isso foi o que fez mudar um pouco o meu som. Eu enjoei um bocadinho o electrónico. Eu quando comecei só queria fazer coisas sintetizadas e agora estou gostando mais desta coisa de tocar e até voltei para o violão. 

Fica um espectáculo mais íntimo…Sim, mais íntimo! Estou gostando disso, no momento. Pode ser que mude daqui a 2 anos…

Quando tocaste a “Milhões de Vozes” disseste que era a música dos próximos 4 anos no Brasil. Acreditas que a tua música pode ser uma forma de luta e expressão perante a realidade política que se vive lá?Eu acho. Eu inclusive quero poder contribuir de alguma forma. Eu sou um cara muito sereno, muito tranquilo, não tenho esse ímpeto da linha diferente. Eu tenho amigos que são militantes e se preocupam com a política de uma forma diferente de mim. São aqueles que estão ali, e são mais agressivos, mas isso também faz parte da luta inteira. 
Mas eu acho que neste momento, no Brasil, você contribui com leveza e alegria, de alguma forma. Não é um escape, mas isso dá força para a gente conseguir imaginar uma coisa melhor no futuro. Um bocadinho de esperança, senão fica todo o mundo desiludido. Quando falam que “vou embora do Brasil”, acho que não é por aí, eu acho que a gente tem que lutar mesmo porque o negócio está feio.

Achas que a Fé é capaz de quebrar algumas barreiras que se constroem no Mundo de hoje?Eu acho, eu acho mesmo que sim. Fé no sentido mais amplo da palavra. Fé na vida também. Fé nas pessoas! Além da fé sobrenatural e do que alguém possa vir a acreditar, mas é muito importante não perder essa fé na vida. Essa é que é a grande luta, é uma coisa que eu luto para não perder e luto para manter isso na minha música. 


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